Em despacho nesta segunda-feira (25), o juiz da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Presidente Prudente (SP), Darci Lopes Beraldo, mandou citar a Prefeitura e o Hotel Portal D’Oeste para que apresentem contestações a uma ação civil pública, protocolada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP), que pede a reabertura de um trecho da Rua Visconde de Cairu, na Vila São Jorge, ao tráfego de veículos. O trânsito no local, que fica ao lado do hotel, está obstruído já há cerca de duas décadas.
O juiz concedeu prazos de 15 e de 30 dias, respectivamente, para o estabelecimento comercial e para a Prefeitura contestarem as argumentações da Promotoria, sob pena de se presumirem verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo MPE-SP.
Beraldo também estipulou que a Prefeitura, se tiver interesse em uma audiência de tentativa de conciliação sobre o caso, poderá peticionar para que seja designado o encontro entre as partes.
A ação civil pública pede a reabertura do trânsito de veículos na Rua Visconde de Cairu, no trecho entre a Avenida Brasil e a Rua Mendes de Moraes.
A travessia de veículos está bloqueada no local já há cerca de duas décadas e, desde então, só é possível a passagem de pedestres no referido trecho, que faz a ligação entre a Vila São Jorge e a Vila Brasil sobre a linha férrea que corta a cidade.
O promotor Jurandir José dos Santos requer à Justiça a condenação da Prefeitura e do Hotel Portal D’Oeste às seguintes providências no local no prazo de seis meses:
Após a realização de todas essas obras citadas, a Promotoria quer que a Justiça determine a reabertura da via pública no trecho da Rua Visconde de Cairu no sentido único de direção da Avenida Brasil para a Rua Mendes de Moraes.
No eventual caso de descumprimento do prazo, o Ministério Público sugere a condenação dos requeridos, ou seja, a Prefeitura e o hotel, ao pagamento de uma multa diária no valor de R$ 1 mil.
Trecho da Rua Visconde de Cairu, entre a Avenida Brasil e a Rua Mendes de Moraes, na Vila São Jorge, em Presidente Prudente (SP) — Foto: Leonardo Bosisio/g1
O promotor de Justiça Jurandir José dos Santos pontua na ação civil pública, à qual o g1 teve acesso, que, em julho do ano passado, já houve uma audiência em que se chegou a um consenso pela reabertura da Rua Visconde de Cairu, no trecho lateral ao hotel, e que, para viabilizar as obras de adequação do local para o leito carroçável e a implantação de passeio público, os responsáveis pelo estabelecimento comercial e os representantes das secretarias municipais de Mobilidade Urbana e Cooperação em Segurança Pública e de Obras e Serviços Públicos se comprometeram a elaborar um projeto para os serviços e um cronograma para a sua execução, dentro de um prazo de 45 dias.
Uma nova audiência foi realizada em dezembro de 2021, segundo o MPE-SP, na qual os representantes do hotel e da Prefeitura apresentaram o projeto de reabertura da via.
No entanto, conforme o Ministério Público, o projeto não definiu as atribuições de cada um dos envolvidos. Segundo a Promotoria, foi deliberado, então, que até o dia 15 de janeiro seguinte o projeto seria apresentado, acompanhado de memorial descritivo, com as adequações sugeridas na audiência e com a definição das competências do município e do hotel.
Ainda de acordo com a Promotoria, a Prefeitura apresentou uma planta elaborada pela Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana e Cooperação em Segurança Pública (Semob) acerca da proposta de como ficaria a circulação de veículos e pedestres na travessa, mas informando unicamente que “a sinalização de trânsito será executada” pela mesma pasta, sem apontar as atribuições dos demais responsáveis pelas outras obras de adequação da via.
“O município já demonstrou que não está levando a sério a atuação ministerial. Se estivesse, responderia corretamente as requisições expedidas, mas não o fez. Desta forma, não restou alternativa ao Ministério Público Estadual que não o ajuizamento da presente ação civil pública”, afirma o promotor de Justiça.
Santos argumenta que, “induvidosamente, é necessário impor ao Poder Público Municipal as providências necessárias para afastar as irregularidades comprovadas no inquérito civil” que acompanha a ação civil pública, tendo em vista “a existência de bloqueio em via pública que impede a livre circulação sobre a faixa de trânsito no trecho da Rua Visconde de Cairu, e a informação e conhecimento por parte da municipalidade, que não possui ou apresentou qualquer autorização legislativa ou estudo de tráfego sobre seu fechamento”.
“A postura adotada pela municipalidade, até o momento, não condiz com as providências necessárias para a resolução definitiva do problema”, salienta Santos.
Ele ressalta que “a inércia e descaso da municipalidade acabam por negar os fins da legislação urbanística, afrontando o princípio constitucional da legalidade que rege toda a atividade da Administração Pública”.
“Isto porque desde o início o município reconhece que não existe autorização do Legislativo acerca de desafetação do logradouro público […],mas não adotou as medidas corretas para regularização da grave falha urbanística reconhecida!”, prossegue.
O promotor cita que a travessia se encontra fechada há cerca de 15 anos e pondera que, antes disso, existia trânsito fluente no local.
“Inclusive durante o curso do inquérito civil foi constatado trânsito no local, mesmo com a existência de aduelas de concreto bloqueando a passagem de automóveis […], tal fato não impede o trânsito de motociclistas, ainda que irregular”, complementa.
“Outrossim, é sabido que o fechamento da via foi determinado sem base em qualquer ato administrativo do Poder Público, sem qualquer autorização legislativa para desafetação do logradouro público e sem qualquer estudo técnico recomendando o seu fechamento, tudo indicando que tal se deu para atender a interesses de particulares que possuem propriedades nos imóveis adjacentes”, afirma o promotor.
Trecho da Rua Visconde de Cairu, entre a Avenida Brasil e a Rua Mendes de Moraes, na Vila São Jorge, em Presidente Prudente (SP) — Foto: Leonardo Bosisio/g1
Ele ainda acrescenta que a linha férrea está desativada há anos, sem qualquer utilização por trens, e que um parecer técnico do Centro de Apoio à Execução (CAEx), do próprio MPE-SP, apontou a possibilidade/viabilidade de abertura da via.
“Disto decorre a necessidade da imediata abertura da via, visto que foi obstruída de forma irregular, sem devida autorização ou estudo técnico para a desafetação do logradouro público. Assim, verifica-se a ilegalidade na omissão do Poder Público em realizar as necessárias medidas para a correção do problema constatado”, enfatiza Santos.
“Deve, pois, ser desobstruída a Rua Visconde de Cairu, assim como deve ser realizada a recomposição do passeio público e adequação da via, sob pena de perpetuação das ilegalidades cometidas, não podendo o Poder Judiciário ser conivente com tais violações à legislação urbanística”, afirma o promotor.
“Com efeito, uma via pública, por sua essência, tem a função principal de garantir livre circulação de veículos e pedestres. Basta a sua existência, no cadastramento de vias da municipalidade, para garantia da livre circulação pela sociedade”, pondera.
O promotor pontua que “não há nenhuma autorização municipal respaldada em ato administrativo, legislativo ou estudo que permita tal situação”.
“Insta salientar que, durante mais de 15 anos, o requerido Hotel Portal D’Oeste utilizou-se (e continua utilizando) do bem público (Rua Visconde de Cairu), como se seu fosse, contando com a omissão do requerido município de Presidente Prudente, já que não há nenhuma autorização municipal respaldada em ato administrativo, legislativo ou estudo que permita tal situação”, conclui Santos.
O promotor relata que, em uma das audiências realizadas entre as partes, os representantes do hotel deixaram clara sua concordância com a reabertura da Rua Visconde de Cairu, no trecho que margeia o estabelecimento, “inclusive por conta da situação vivenciada no local, com constante movimentação de usuários e traficantes de drogas, os quais usam a passagem em nível para chegar à Rua Mendes de Moraes, justamente pelo acesso bloqueado pela municipalidade”.
Em nota ao g1, a Prefeitura de Presidente Prudente informou que, desde o ano passado, vem dialogando com o Ministério Público e com a administração do hotel “justamente para viabilizar a reabertura daquela via”.
“Os projetos de engenharia da Semob já foram concluídos e, agora, a pasta aguarda a elaboração do projeto por parte do setor de engenharia do próprio hotel para então liberar novamente o tráfego de veículos naquele local”, salientou o Poder Executivo ao g1.
“Nosso jurídico está ciente da ação civil, mas até o momento não temos um posicionamento oficial”, disse ao g1 nesta segunda-feira (25) o gerente do Hotel Portal D’Oeste, Renê Dutra.