Durante o encontro virtual, que reuniu dezenas de mulheres para discutir políticas públicas e ações de empoderamento na cidade, ao menos dois homens entraram na sala e começaram uma série de ataques, interrompendo momentaneamente o evento.
No chat da reunião, o internauta identificado como Camilo Silva postou frases com ofensas contra mulheres negras: “mulher tem que ser escrava” e “essas macacas”.
Um outro internauta usava a foto de uma suástica. Os dois perfis foram retirados da sala de reunião, que pode ser retomada. Mas a situação causou indignação das participantes, que fizeram prints das mensagens e registraram um boletim de ocorrência.
Um dos internautas presentes na reunião do Conselho de Políticas Públicas para Mulheres de Bauru que foi alvo de ataques machistas também usava a foto de uma suástica, símbolo do Nazismo — Foto: TV TEM /Reprodução
O delegado José Antônio Milagre, especialista em crimes digitais, diz que os infratores, embora adotem falsos perfis, podem ser identificados pela Polícia Civil.
“Enganam-se aqueles que pensam que não podem ser identificados. A perícia técnica e a cooperação judicial das plataformas permitem a identificação dos ofensores na maioria dos casos onde a identidade, inicialmente, é incerta”, explica o delegado.
O caso trouxe à tona situações semelhantes que vêm se repetindo em reuniões online, corroborando que a situação da última quarta-feira (18) não foi uma exceção. Aliás, essa não é a primeira vez que uma reunião promovida pelo Conselho das Políticas Públicas para Mulheres foi invadida por internautas com mensagens racistas.
Em novembro do ano passado, uma palestra online que discutia o racismo, promovida pelo conselho em parceria com a Prefeitura de Bauru e apoio da Universidade Estadual Paulista (Unesp), foi alvo de ataques.
Durante o evento, mediado por mulheres negras, um vídeo com três gorilas dançando e emitindo sons do animal foi apresentado aos ouvintes por meio de compartilhamento de tela.
“É importante registrar todos os dados do evento e as provas das ofensas. É possível pedir à plataforma os registros de acesso à aplicação do usuário que ofendeu. As plataformas guardam os dados por seis meses, por obrigação do Marco Civil da Internet”, explica o delegado José Antônio Milagres.
A situação também foi vivida pela designer Gabriela Cunha. Durante a apresentação online de seu Trabalho de Conclusão de Curso, na Unesp Bauru, em uma sala virtual com cerca de 50 pessoas, participantes não identificados começaram a ofender orientadores e participantes da reunião.
“Não sei se eram ataques ordenados, eles eram bem aleatórios, nada especifico. Eram palavrões e sons estranhos, haviam várias pessoas realizando os ataques. A administradora da chamada expulsava vários, mas entravam outros”, relembra Gabriela.
“Eu acredito que eles conseguiram o link porque eu coloquei nas minhas redes sociais. Vinte minutos depois que postei, um amigo me falou que isso era ruim, porque estavam invadindo esses links, e eu apaguei na hora, mas mesmo assim eles devem ter salvado pra no outro dia realizar a invasão”, conta a designer.
A invasão com o fim de obter dados, ainda que a sala não esteja protegida, pode caracterizar crime previsto no art. 154-A do Código Penal, com pena de até quatro anos de reclusão.
Além disso, outros crimes decorrentes de ações durante a invasão, como difamação, ameaça ou mesmo injúria racial, podem aumentar a pena para mais três anos de reclusão. O Senado aprovou na última quarta-feira um projeto que aumenta para 2 a 5 anos de reclusão e multa a pena de injúria racial, que passa a ser crime imprescritível e inafiançável
“Com o registro do BO e as provas colhidas, é possível que seja feita a quebra judicial de sigilo informático. Neste caso, a autoridade judicial determina ao aplicativo que forneça os registros que permitirão buscar a autoria dos crimes”, explica o delegado.
“O nosso objetivo é que a punição seja educativa, que realmente essa pessoa, que para mim é de uma ignorância sem tamanho, realmente faça algo em prol da conscientização das pessoas e da luta contra o racismo, porque não adianta apenas pagar cestas básicas, a gente precisa mudar essa realidade do racismo estrutural”, destacou a presidente do Conselho da Comunidade Negra, Sebastiana de Fátima Gomes, um dos principais alvos dos ataques durante a reunião do Conselho de Políticas Públicas para Mulheres de Bauru.
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