Os versos de amor escritos à mão em 1939 são registros do início da história de um casal que permaneceu junto por mais de 50 anos. Armando Guelpa dedicou, em vida, poesias para sua amada Aurora e montou um livro com as declarações, que ainda é guardado por familiares em Marília (SP).
Impresso com capa dura e letras douradas, o livro de poesias traz o sentimento que surgiu na época em que o casal se conheceu. Armando se aposentou como ferroviário e morreu aos 76 anos, em 1996, e Aurora Monteiro Sanchez Guelpa morreu em 2016, com 96 anos.
No Dia Mundial da Poesia, celebrado nesta segunda-feira (21), a família do casal relembrou o amor dos dois que foi presente na vida e na escrita. Eles casaram em 1940 e tiveram quatro filhos, conforme contou ao g1 a neta deles, Rafaela Guelpa Capelloci, de 40 anos.
“A gente herdou amor. Eu acho que isso é mais valioso do que qualquer tesouro. Eles foram felizes para sempre. O livro é o amor materializado, é uma forma completa de respeito.”
Armando e Aurora nos anos 90 — Foto: Arquivo Pessoal
A autoria de alguns dos poemas é incerta, de acordo com Rafaela. Com o tempo, Aurora também escreveu sonetos no livro e improvisou a numeração das páginas. Mesmo após mais de 80 anos, as folhas continuam conservadas.
“Ela guardou até o fim da vida dela. Deixava na cômoda, junto com as roupas. Depois que ela morreu, a gente sentou e pôde folhear o livro. Tem a letra da minha avó, do meu avô.
Armando Guelpa dedicou um livro de poesias para a esposa, em 1939 — Foto: Arquivo Pessoal
Um dos poemas se chama “Cartas do meu coração” e foi selecionado por Armando Guelpa em 22 de junho de 1941. Confira abaixo a descrição de um dos trechos:
“Uma cartinha envio-te, medroso da resposta que possas me mandar. Porque, talvez, teu coração maldoso, o meu que te ama, vinha a desprezar. Ele que vive sempre a suspirar por ti, por teu sorriso tão formoso, que implora quase a graça de um olhar. Iludido de amo e venturoso”, escreveu.
Armando escreveu, em Marília, poemas para sua esposa em 1939 — Foto: Arquivo Pessoal
Outro poema que Armando colocou no livro, em 19 de novembro de 1939, é do poeta Gonçalves Crespo (1846-1883), chamado “Alguém”.
Também foram reunidos por Armando alguns escritos do poeta Luís de Camões (1580-1580 ), todos dedicados para Aurora.
Armando, de Marília, citou no livro um poema de Gonçalves Crespo — Foto: Arquivo Pessoal
Apaixonada por música, poemas e arte, o sonho de Aurora era ter sido professora. Em entrevista ao telefone, uma das filhas do casal, Rosa Helena Guelpa Capelloci, de 70 anos, relembra os momentos em que a mãe cantava em casa. Emocionada, ela embala a melodia que ouvia na voz da mãe:
“Aí que saudades que eu tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais. Que amor, que sonhos, que flores”, canta Rosa Helena, durante a entrevista, um trecho do poema “Meus Oito Anos”, de Casimiro de Abreu.
A saudade dos pais é algo que Rosa Helena está aprendendo a lidar com o passar dos anos. Algumas memórias permanecem mais presentes que outras, como os versos cantados pela mãe.
“Eu me emociono demais porque eu estou ouvindo ela cantar, recitar. Ela gostava muito de cantar. São coisas que ficam na nossa memória e no nosso coração. A gente não quer se desfazer do livro porque é a união ainda de nós. É uma volta no tempo.”
Armando e Aurora se casaram em 1940 — Foto: Arquivo Pessoal
Para Rafaela, a história é o testemunho de um amor presente na família, algo que ela busca passar para as pessoas que conhece e aos filhos.
“Já no finalzinho da vida dela, ela falava muito do meu avô. Eles sempre estiveram um para o outro de forma muito completa, nunca se abandonam. O amor nunca foi uma coisa de quebrar e jogar fora. Nunca vi eles brigarem, sempre tiveram muita compreensão.”